8.9.11

A Eterna Solidão de Kolody

A vida é mesmo a arte do encontro e desencontro...

José Wille – Com toda a sensibilidade da poesia, a senhora era uma pessoa romântica?
Helena Kolody – Muito romântica e gostava de ler, sempre li demais. No começo, eram aqueles livros água-com-açúcar, mas, depois, também li ótimos livros. Por que não podia comprar livros, sempre fui uma frequentadora da Biblioteca Pública, da biblioteca dos clubes, das escolas, do Instituto de Educação... Sempre tirei livros de lá.
José Wille – A senhora nunca se casou. Foi uma vida solitária ou dar aulas, ter esse contato com jovens, acabou suprindo essa necessidade de companhia? A senhora sonhava em ter filhos?
Helena Kolody – Lógico, sonhava... Houve um tempo em que eu chorava por estar sozinha e, às vezes, tentei ver se gostava de outros, mas não... E ficou aquela coisa – o sonho é sempre mais bonito que uma realidade triste. Mas eu sempre transferi este meu instinto maternal, que é tão forte, para os meus irmãos, para os alunos... Outro dia, encontrei uma aluna que me impressionou demais, uma senhora de uns sessenta e tantos anos, que me abraçou e disse “A senhora me deu um carinho que minha mãe não deu”.
José Wille – Como professora em Ponta Grossa, a senhora teve uma grande paixão. Por que acabou não dando certo?
Helena Kolody – Porque eu nunca revelei. Ele era um homem importante, era diretor do ginásio, de família importante e já gostava de alguém. Às vezes, dançava comigo nos bailes, flertava comigo na rua, mas eu nunca demonstrei, porque eu tinha medo do ridículo. Como a Escola Normal foi transformada de primária em secundária, e as professoras de Ponta Grossa vieram tirar curso, na primeira turma que eu lecionei, elas eram mais velhas do que eu. E eu pensava “Como elas vão se divertir às minhas custas, se isto não der certo...!”. Então, tinha medo, tinha pudor, por isso nunca revelei.
José Wille – A senhora se reprimiu, nunca contou sobre sua paixão?
Helena Kolody – Ficou aquela paixão recolhida... Depois, vim embora e nunca mais soube dele. Os íntimos sabiam da minha paixão, mas os outros, não.
José Wille – Não se arrependeu depois?
Helena Kolody – Não, porque, no fundo, eu acho que ele não iria me amar, tanto que ele se casou com essa de quem gostava. Uma amiga sabia dessa paixão, a gente conversava sobre isto, mas para os outros nunca contei.
José Wille – E houve uma segunda paixão e até um noivado. Por que não deu certo?
Helena Kolody – Porque ele bebia. Era uma pessoa extraordinária, nós combinávamos muito bem, ele também era escritor, uma pessoa formidável, mas ele bebia e eu tive medo. Por que o alcoolismo é uma doença hereditária, ela se manifesta de outras formas, mas sempre é uma coisa que pode dar um filho anormal, não é? Justamente porque eu queria ter filhos, eu desmanchei. Ele disse “Teu mal é ser professora de biologia”. Na primeira vez que ele tomou aquele pileque e me telefonou falando com a língua arrastada, assim que ficamos noivos, desmanchamos sem brigar, mas ele disse “Se você casar com outro, eu morro”. E eu lhe disse que não ia casar com ninguém. E ele casou, os filhos deles sabiam que ele me queria bem... Mais tarde, tentou reatar, mas eu lhe disse “Não, você está casado, sua vida é outra, de modo que isso está para sempre acabado”.
José Wille – Foi uma opção de vida, afinal?
Helena Kolody – Foi uma opção de vida. Pelo conhecimento que eu tinha de biologia, se uma pessoa que tem tendência ao alcoolismo casa-se com uma mulher que não tem ninguém com este problema na família, pode ter filhos normais; mas, com a tendência que na minha família também tinha, eu poderia ter um filho alcoólatra ou anormal, podia ser débil mental, epiléptico, porque isso são coisas que vêm do alcoolismo. 
José Wille – Não foi exatamente o que a senhora sonhava, mas a vida de professora acabou suprindo então...
Helena Kolody – Foi um período bonito, um período feliz aqueles dois meses de noivado. E tem certas coisas que a gente não sabe por quê, de onde vêm, mas ficam e marcam a gente. Quando eu morava na Carlos de Carvalho, alguém jogou para dentro do nosso jardim um ramo de rosas com um bilhete “Helena, como o perfume dessas rosas, o meu amor, puro, desinteressado e sincero”. Até hoje eu não sei quem fez isso...

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